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FALO AINDA ÀS ROCHAS (poesia)


O engano que se ama

é como o veneno

disfarçado de outros sabores.

Disimulado e encantador, vem;

ningúem percebe e o bebe,

como se fosse um bem.

 

Poucos notaram

as quedas e pedras falseantes,

dos argumentos escorregadios da correnteza,

que na pressa e no temor

escondia os perigos da segura incerteza.

 

Tentei avisar.

Solito fiquei em meu grito,

reputado como a errar,

desacreditado,

vendo o navio afundar.

 

Tão logo beberam as notícias,

embriagaram-se com elas.

Agarraram-se às garantias do vento,

no calor do abrasador momento,

que aterrorizou as multidões

e as fez como massa -

massa de manobra

e, de sobra, em peões.

 

Vestiram-se, injenuamente,

com as roupas da propaganda

nas leis e decretos da guerra,

acreditaram nas promessas, às pressas,

a pretexto de uma nova e segura terra.

 

As ameaças invadiram as ruas,

tremeram e calaram vozes.

As prisões da mente

encarceraram o tímido bom senso.

A desinformação venceu,

a razão serena pereceu.

 

Agora, administramos o silêncio,

quietos, mitigamos os danos

dos nossos enganos,

conformados com a normalidade anormal;

sem mais perceber a confusa beleza da derrota

na rota daquilo que tivemos por certeza.


Sou apenas uma voz no deserto.

De certo que fiquei

daquilo que sobrou

da multidão dos aflitos.

Perderam-se meus gritos,

não ecoam mais e jamais.

 

Falo ainda às rochas.

as rochas não ouvem,

não sabem, não sentem dor,

voltaram ao pó, ao pó da terra;

terra arrazada pela guerra.

(Yldo Gaúcho)

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